Eu estava escrevendo um outro texto sobre minhas andanças profissionais e acabei entrando no assunto sobre minha infância e adolescência. Basicamente, ser uma pessoa muito sensível (não no sentido de me afetar por qualquer coisinha, mas no de sentir tudo com muita profundidade) ferrou com quase tudo na minha vida, inclusive profissionalmente. Na verdade, não pelo fato de eu ser assim – mas de ter que fingir que eu não sou.
A vida inteira a partir da minha adolescência eu tive muita dificuldade de fazer amigos porque eu tentei mascarar o meu romantismo, sensibilidade e ingenuidade indo quase para o oposto disso tudo tentando ser aceita. Eu comecei a namorar muito cedo porque era só assim que eu tinha companhia fora da escola. Quando um namoro terminava, em menos de 3 meses eu começava outro, e assim fui seguindo a vida até os meus 21 anos, que foi quando eu finalmente comecei a criar coragem de sair completamente sozinha e me enfiar entre as pessoas – só que para conseguir fazer isso, eu fazia merda. Sim, isso mesmo que vocês estão pensando, aquela merda que te deixa mais corajoso e falante, sabe?
Foi numa dessas saídas que um homem claramente mais velho e nada atraente ficou me cercando na balada: eu disse que não estava afim, mas ele não desistia e “casualmente” aparecia sempre onde eu estava, fosse no bar, no fumódromo ou na pista e se metia nas conversas em que eu participava como se estivesse comigo. Ele forçava tanto a barra que acabei cometendo o erro primordial de ceder e beijá-lo achando que ele ia se dar por satisfeito e me deixar em paz, mas ele continuou me cercando até eu sair e ir para outro lugar terminar de curtir minha noite.

Mas o fotógrafo da balada tirou uma foto nossa (em que eu parecia bem incomodada inclusive) e através dela, o bendito me achou na rede social. Nos comentários mesmo rolou uma interação e eu resolvi adicioná-lo porque ele trabalhava como VJ e eu estava tentando fazer o máximo de contatos possíveis na cena eletrônica/urbana tanto para oportunidades quanto para conhecer gente mesmo. Começamos a conversar e ele era inteligente, experiente na cena e conhecia um pouco da minha religião da época (wicca) e queria entender mais, então, um dia marcamos de eu levar uns livros sobre o assunto para ele.
O cara não era bonito, mas era oito anos mais velho e tinha vivido várias aventuras que para mim, naquela época, eram apenas sonhos. O que lhe faltava em aparência sobrava em boa conversa – e eu, trouxa e sem autoestima, caí. Ficamos naquela noite e tudo o que rolou foi bom, mas até aí era só mais um. Na semana seguinte, ele foi chamado para se apresentar numa balada que eu queria muito conhecer e me convidou para acompanhá-lo, eu aceitei e antes passei na casa dele. Praticamente assim que cheguei, ele empurrou uma aliança de alumínio no meu dedo e disse (não perguntou nem pediu) que agora eu era sua namorada. Sabem o que eu fiz?
Nada.
Lembram que eu falei que para dar conta de interagir com as pessoas eu estava fazendo merda? Pois já fazia alguns meses que eu estava nessa e estava começando a ficar perigoso, então pensei que talvez esse cara tivesse sido colocado no meu caminho para eu sossegar antes que desse ruim de verdade pra mim. Então eu só aceitei.
Obviamente, olhando com a perspectiva e a quantidade de informação que temos hoje em dia, muitos de vocês já estariam levantando todas as bandeiras vermelhas para esse cara. Outros podem estar me julgando como mente-fraca ou coisa assim, e eu era mesmo. Eu só queria viver, aproveitar, conhecer mundos e pessoas e me coloquei em várias situações de risco (inclusive físico) para isso. Mesmo aos 21 anos eu ainda queria ser legal e descolada, não mais a menina romântica e sensível que tocava violino e chorava ouvindo Sandy e Junior pensando em amores platônicos e por isso era zoada e excluída. Na noite, além de legal e descolada, eu era bonita e desejada, coisa que nunca tinha acontecido na escola. Quando você não aceita e banca aquilo que você é, outros fazem com que você seja o que eles quiserem. E um cara mais velho e experiente faz isso com maestria com quem não tem outra pessoa para contar.
Eu quero continuar falando desse meu relacionamento porque ainda tem MUITA coisa que mostra o tanto de sinais que eu ignorei, a quantas coisas uma mulher privilegiada e esclarecida pode se submeter e os motivos disso, eu quero que as pessoas entendam que permanecer num relacionamento abusivo sabendo que te faz mal NÃO é uma questão de escolha em sã consciência. Eu vou falar disso em outros posts daqui para frente – e no final, um bônus: vocês entenderão porque escolhi não dar meu rosto à Andarilha dos Mundos.
Continuem andando comigo, aproveitem e compartilhem: você também já caiu nessa armadilha de dar chance para um feio e ele acabar com sua vida?
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